E todas as dúvidas foram incineradas


É conhecido o reacendimento da polémica à volta da construção de uma central incineradora de resíduos em S. Miguel. Esta solução tem sido vendida pelos responsáveis da AMISM e da empresa intermunicipal MUSAMI como a única e miraculosa solução para todos os problemas relacionados com os resíduos em S. Miguel.

Tendo sido contestada por associações ambientalistas, que inclusive apresentaram soluções alternativas, por cidadãos e alguns partidos como o Bloco de Esquerda, o projeto foi fazendo o seu caminho não isento de percalços, não só devido à contestação ao projeto mas também à própria incapacidade da AMISM em o concretizar, como se pôde constatar com a anulação do primeiro concurso público em abril de 2014 e o lançamento de um novo concurso com alterações significativas ao caderno de encargos. Mas o que é certo é que foram tomadas duas decisões inequívocas pela AMISM e pelos municípios que a compõem. Decisões desta importância, quando está em causa um projeto que irá condicionar a gestão de resíduos na ilha durante décadas, que irá custar 63 milhões de euros e que, principalmente, pode ter implicações graves na saúde pública e no ambiente, não podem ser tomadas sem grande ponderação, aconselhamento técnico e sentido de responsabilidade. Queria acreditar que assim seria.

No entanto, em setembro deste ano, apareceu uma voz entre os vários presidentes da câmara da ilha de S. Miguel que integram a AMISM, a do presidente da Câmara da Ribeira Grande, Alexandre Gaudêncio, a levantar dúvidas sobre a opção pela incineração. Mais alguns meses e não seria dúvida, seria arrependimento. Estranhamente, fizeram-se dois concursos públicos sem que ninguém tivesse dúvidas, nem mesmo Alexandre Gaudêncio. É comum os estudantes (e também os professores) dizerem que só depois de se estudar é que surgem dúvidas. Estas não terão sido alheiras ao (mau) funcionamento da incineradora da ilha Terceira. Até aqui tudo bem, devemos sempre aprender com a realidade e o que foi feito na ilha Terceira não deve ser repetido em São Miguel.

Das dúvidas surgiu alguma discussão pública mas não surgiu qualquer esclarecimento relevante por parte dos responsáveis, para além da afirmação pública de que o projeto da incineração não é viável sem a construção de uma central hídrica reversível, condição esta que nunca tinha sido colocada como imprescindível até aqui. A 14 de dezembro a AMISM anunciou a sua decisão, decidindo avançar definitivamente com o concurso público que se encontra a decorrer, com base em “garantias”, que ninguém conhece, de que a central hídrica reversível, considerada fundamental para a viabilidade da incineradora, irá avançar. Não se sabe é quando nem onde. Mas valores mais altos se levantam. A AMISM saberá quais. Que tenham sido esclarecidas as dúvidas a Alexandre Gaudêncio porque quem não esteve na última reunião da AMISM ficou exatamente no ponto em que estava.

Entretanto, do Governo Regional, apenas se ouviram declarações enigmáticas do Presidente do Governo. Da nova Secretária Regional da Energia, Ambiente e Turismo, que por acaso tutela tanto o ambiente como a energia, nem uma palavra se ouviu. Será que ainda não estudou ou apenas não quer ter nada a ver com o assunto?