37%


37% dos trabalhadores por conta de outrém nos Açores recebem apenas o salário mínimo. Fixemos este número pois ele revela e revelará no futuro mais do que parece.

Ainda na passada semana, um dos partidos que integra o governo regional, o PPM, propôs que se alargasse à região o apoio que é atribuído às empresas para compensar os custos com o aumento do salário mínimo.

Esse apoio não faz qualquer sentido, nos Açores ou em qualquer parte do país por um motivo central: subsidiar as empresas que pagam o salário mínimo é dizer-lhes que devem continuar a pagar o salário mínimo pois aumentar salários sai duplamente caro: há o custo com o aumento do salário e o custo com a ausência de subsídio.

É um sinal profundamente errado que se dá às empresas, ao mesmo tempo que se incentiva o pagamento do salário mínimo em vez de se procurar mecanismos para melhorar os salários. Apenas o Bloco e o PAN votaram contra a proposta do PPM.

A verdade é que a última coisa que os Açores precisam é de incentivos para que as empresas paguem o salário mínimo. Este é o valor salarial que mais se pratica nos Açores.

Recentemente o Bloco solicitou ao governo dados relativos ao número de trabalhadores por contra de outrém nos Açores que auferem o salário mínimo.  Os dados não surpreendem e confirmam o que se suspeitava: os Açores têm, proporcionalmente, muito mais trabalhadores a auferir o salário mínimo do que o resto do país. Em 2020, no continente, 23,5% dos trabalhadores por conta de outrém auferiam o salário mínimo. Nos Açores são 37%, valor que aumentou em 3 pontos percentuais em 2019.

São dados chocantes que explicam também muito do risco de pobreza que existe nos Açores.  São 18.728 trabalhadores que têm quase sempre demasiados dias nos mês para tão pouco salário!

Por região, e segundo o ministério do trabalho, apenas o Alentejo (31,7%) e o Algarve (30,8%) ultrapassam os 30% de trabalhadores por conta de outrem a auferir o salário mínimo, muito abaixo do que se passa nos Açores.

Este é o resultado de uma economia que pouco inova e não cria valor, centrada em setores de baixo valor acrescentado; de uma legislação laboral que não promove a contratação coletiva e fomenta a precariedade e que, por consequência, limita a progressão nas carreiras; da quase ausência de aumentos salariais na função pública.

Perante estes dados, como se justifica que se queira incentivar ainda mais o pagamento do salário mínimo? Qual é o objetivo, ter ainda mais trabalhadores a receber apenas o salário mínimo na região? Se os Açores já são uma região de salário mínimo, o caminho preconizado apenas aprofundará esse fosso onde nos afundamos. É este o programa da direita.

Perante este cenário é assustador que haja partidos que defendem no seu programa eleitoral, como a IL, a definição de salários mínimos municipais porque há “pessoas com poucas qualificações que moram no interior e que estariam disponíveis para receber um salário mais baixo”. Quem diz “interior” diz Açores ou algumas das suas ilhas. O que pretende esta medida é aproveitar o desespero de quem não tem comida para pôr na mesa para pagar cada vez mais miseravelmente. É um modelo de sociedade que pouco difere da lei da selva.

Há decisões importantes a fazer quanto à política salarial para o país e para os Açores. Como se vê, à direita só se pretende limitar o crescimento dos salários e até mesmo fazê-los descer.

É preciso atacar os vários fatores que contribuem para que 37% dos trabalhadores por conta de outrém nos Açores não recebam mais do que o salário mínimo. A solução não é incentivá-lo e muito menos baixar salários.